06 julho 2010

Esmolas no Metro

Uns trazem cãezinhos pendurados no ombro, com uma pequena lata no sítio da trela, e abrem desalmadamente as desafinadas notas de um acordeão; outros batem com as bengalas nos varões metálicos e berram; há ainda os que martelam com um objecto de metal numa lata, enquanto com a outra mão marcam o ritmo com a bengala no chão, e murmuram uma espécie de canção; e os que, quase em silêncio, pedem “a sua moeda mais pequena”. Também os que, chegados ao fim da carruagem, e caso nada tenham recebido, ofendem quem nada lhes deu.
Cegos a pedir esmola no Metro de Lisboa.
Não há carruagem em que não apareça um. Ou mais.
Para além dos cegos, há os que o não são, mas também pedem. Tocam nos braços dos que se fazem distraídos, esticam a mão. Nada dizem. Mas lá andam.
Os passageiros terão de ser obrigados a ter diariamente este desassossego nas suas viagens? Os turistas assistem a tudo isto, olhando-se incrédulos. Um transporte público não pode ser isto.
São sempre os mesmos, mas são muitos. Novos e velhos, homens e mulheres. Todo o dia, todos os dias.
Miséria que se lamenta, indiscutivelmente.
Se não há solução para a mendicidade, que não é só portuguesa, tem de haver, pelo menos, resolução para este degradante espectáculo, que se arrasta.
A administração do Metro não tem uma palavra a dizer?

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3 Comentários:

Anonymous Divagarde disse...

Havia um casal em tempos, sempre me lembro deles com alguma idade, apenas um deles invisual. Pediam esmola no Rossio. Antes tomavam o pequeno-almoço num café de um senhor conhecido dos meus pais, iam e regressavam de taxi.
Pouco abonatório e motivador para a adolescente que eu era.
Mas já encontrei também nas escadas do metro de Arroios, um senhor com ar tímido que me impressionou bastante. Não pedia propriamente, vendia um conjunto de esferográficas por cinco euros, que custariam 1/4 do pedido, mas jamais esqueci o seu ar envergonhado, deixando perceber que era genuína necessidade. Dei os cinco euros e dispensei as esferográficas.
Também já encontrei uma idosa que, igualmente timidamente, me pediu se lhe pagava a luz mostrando a factura. Ainda hoje lamento ter sido tão inesperado que nem o endereço lhe pedi para lhe poder enviar todos os meses esse pagamento.
Mas também já assisti, não no metro mas junto à CGD na Calçada do Combro, a guerra declarada de invasão de terreno, em que a mais nova tirou o chinelo do pé e vai de bater fortemente na concorrente que já ia bem nos setentas.
Há de tudo. E é difícil distinguir o que move quem pede. Mas perturba-me. Se a necessidade não é genuína, então é miséria de espírito e essa é, igualmente, digna de comiseração.

4:58 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

Mas isto faz lembrar ali os ciganos do rendimento minimo que todos os dias aparecem no Centro a tomar o pequeno almoço no Tabuleiro ou no Jamba.
Vou ver se me consigo alistar no rendimento minimo.
Porque é que a Junta não requisita esse pessoal do rendimento minimo para ir trabalhar nos jardins ?
Assim é que era democratico e não havia segregação.
O trabalho dignifica as gentes e as raças.

5:15 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

E recebem com certeza o Rendimento Social de Inserção; ou seja os Portugueses que dão esmola estão a pagar de duas formas para a manutenção desta gente que se habituou a viver sem ter necessidade de de se preocuparem com a reinserção e o trabalho.

J.Micaelo

2:55 da manhã  

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